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terça-feira, 2 de novembro de 2010

CULTURA CAIPIRA – um repositório da cultura erudita

CULTURA CAIPIRA – um repositório da cultura erudita
A cultura caipira é o resultado de uma mistura, basicamente entre os europeus de origem portuguesa e os índios brasileiros, sendo enriquecida também pelos africanos. A partir dos anos 1900 é que o nome caipira começou a ser mais utilizado, para designar aquele que trabalha no campo - (do Tupi: caa = mato e pir = cortar); portanto caipira é originalmente aquele que corta o mato. Cultura caipira é a soma de conhecimentos milenares de índios em contato com os portugueses. Do ponto de vista lingüístico, a forma caipira de se falar o português, é chamada de dialeto caipira. Esse dialeto ainda é preservado em locais como a zona Rural de Formosa, e já foi tema de várias pesquisas linguísticas da UnB e de muitas outras universidades. Quando os portugueses chegaram aqui, trouxeram livros como os de Camões e com essa linguagem conversavam, e tendo ela como farramenta o “Rey” escrevia.
Uma carta escrita pelo então governador Tomé de Sousa ao Rei D. João III em Portugal, da Cidade do Salvador, em 18 de julho de 1551 mostra um pouco dessa origem linguística:  “Senhor. Nas deradeyras que o anno pasado escrevy a V. A. dezia que Pêro de Guoees capitão moor do mar desta costa e o provedor moor e o olvidor gerall lerão idos desta cidade...”.
Note que as palavras deradeiro e dezia , ainda permanecem no dialeto caipira, pois eles são na verdade herdeiros de uma língua culta, sendo depois misturada com palavras do Tupi. Porém, como ficaram afastados dos centros urbanos por um período de tempo muito grande, conservaram em seu dialeto um conjunto de palavras e uma forma de falar devagar, sem pressa com muita paciência. Essa velocidade de fala é herança do jeito indígena de falar. A pronuncia do “L” no final da palavra é herança dos portugueses. Portanto prestemos atenção ao nosso preconceito linguístico quando ouvirmos alguém falar, pois há riquezas culturais que ainda não conhecemos.
A música caipira é outro patrimônio cultural resultante dessa mistura. As violas de dez cordas foram trazidas das várias regiões de Portugal, e eram usadas em missões religiosas. Da mistura do português e do tupi veio o vocabulário caipira, e dos instrumentos e tradições trazidos pelos portugueses somados à velocidade de fala do índio, foi sendo construída uma forma bem específica de contar histórias e impressões através da música. Dessa forma a música chega a ser a síntese de um complexo conjunto de saberes, de heranças da língua, da velocidade da fala, dos instrumentos que foram trazidos pelos portugueses, assim como pelas mensagens, narradas pelas letras. Alguns ritmos como o cateretê (catira), com batidas marcadas pelas palmas e pelas pisadas de pé, também são fruto dessa fusão entre brancos e índios.
A música caipira começa a ser gravada na década de 1950, com duplas como Alvarenga e Ranchinho. Você sabia que José Fortuna (1923-1993) compôs uma música para a inauguração de Brasília, chamada: “Sob o céu de Brasília”?.
A contribuição dos tropeiros é uma forma à parte de elaboração musical, que servia inclusive para levar as notícias de um local a outro, muitas vezes produzidas em locais de pouso. Um outro fator de contribuição dos tropeiros para o Brasil é a culinária. Quem nunca comeu um feijão tropeiro?
Sendo por meio da língua e do vocabulário que ela conserva, pelas manifestações musicais, pela culinária, e por inúmeras manifestações folclóricas que aqui não foram tratadas, temos que conhecer melhor essa riqueza da cultura caipira, que ainda é pouco explorada por nós. Afinal de contas, não é possível gostar e nem preservar o patrimônio cultural que não conhecemos.
Bráulio Antônio Calvoso Silva é pesquisador independente, escritor e formado em Letras pela Universidade de Brasília.

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